Pessoal, aí está mais um texto que trabalhamos em aula. Lembrando que trata-se de uma adaptação, o texto original está aqui.
Quadro de Debret com crianças brancas e negras brincando juntas. |
As
brincadeiras demonstravam um olhar sensível para a realidade da época: brincar
de ser adulto possibilitava para os meninos ricos imaginar-se como
proprietários dos escravos e maltratar animais diante das crianças escravas,
como exemplo do que poderiam fazer com “seus escravos”. Algumas crianças tinham
seu próprio chicote e os filhos de fazendeiros faziam das crianças negras o seu
próprio brinquedo, exigindo que fossem seus cavalinhos ou “animaizinhos da fazenda”.
O ambiente doméstico e o fato de
meninos livres e escravos brincarem sob o mesmo teto reforçam a ideia de
amizade entre eles, como se as brincadeiras fossem capaz de diminuir a
violência escravocrata. Mas não era assim. Embora fosse possível encontrar no
cotidiano situações nas quais as crianças brincavam juntas apesar das
diferenças entre livres e escravos, com frequência partiam para ações que
demonstravam a ideia de mando do menino branco sobre o negro. Não é a toa que o
sociólogo Gilberto Freyre encontrou nos seus estudos a figura do
“leva-pancadas”: criança negra que era companheira de brincadeiras dos filhos
dos fazendeiros, mas em geral tinha de fazer papeis de submissão, como o
“cavalinho”.
Babá negra "cuida" de filho de membros da elite. Imagens de submissão comuns no século XIX. |
Entre as
meninas, havia a brincadeira de “tornarem-se comadres” quando tinham um objeto
em comum: a boneca de louça. Batizavam as “filhas-bonecas” e tomavam chá
repetindo alguns modos que observavam quando senhoras ditas distintas as
visitavam. As bonecas de louça eram louras e de olhos azuis, vestidas de modo
elegante e nunca saiam para a rua, assim como suas “mães”.
As bonecas de pano eram mais voltadas para as meninas menos abastadas,
produzidas artesanalmente por tias ou mães das crianças. As bonecas de pano
eram doadas quando suas donas cresciam e depois eram restauradas. As de louça
eram raras de serem doadas. Crescendo a menina-mãe da boneca, era mais provável
que o brinquedo se mantivesse como relíquia da casa.
Enquanto as meninas de elite
brincavam mais dentro de casa, os meninos brincavam fora – não necessariamente
na rua, mas nos quintais das grandes casas dos senhores.
Frutos da imaginação infantil, as “comadres” unidas no batismo das
bonecas de louça e os “senhores” que transformavam pequenos escravos em animais
foram personagens do Brasil Império.
Texto adaptado de: FREITAS, Marcos. Brincando de ser adulto. IN: Revista
de História da Biblioteca Nacional, ano 8, nº 89, fev. de 2013.
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